A certa altura do caminho, a comitiva foi alcançada por uma escolta do rei, com ordem de matar o menino e algemar seus pais; porém Nossa Senhora, com os seus rogos e lágrimas, conseguiu abrandar o centurião que comandava; e deu-lhe de presente o burro.
Depois, a Virgem Maria e São José, com muito custo, lá foram empurrando o carro onde ia dormindo, muito sossegado, o Menino Jesus. E foram andando… andando… andando…
A escolta ia seguir o seu caminho, de volta, porém parou, porque o burro tinha-se empacado… Embalde o centurião chicoteou o animal; depois bateu-lhe com o pau da lança; depois com a bainha do espadão; nada!… o burro, sempre empacado!…
Todos os soldados juntos e ao mesmo tempo espancaram-no; o burro, sempre empacado!…
Então o centurião ficou furioso, dizendo-se enganado pela Virgem que lhe dera tão ruim animal. E resolveu perseguir os fugitivos para seu castigo.
A Virgem e São José não viram o que atrás deles se passava, somente ouviam o rumor das pancadas que os soldados davam no burro e as blasfêmias do centurião… E assustados, apuravam forças, empurrando o carrinho.
Então o Menino Jesus acordou-se e teve fome; mas, com o muito cansaço e sofrimentos, o seio de Maria não apojou…
Nisto apareceu uma mulita e Nossa Senhora disse-lhe:
- Mulita, se tens filhos, dá-me uma gota do teu leite para o meu filho!…
E a mulita parou-se e deu a gota de leite; mas era muito pouco e o Menino continuou chorando, com fome…
Nossa Senhora chorou de pesar e tornou a dizer:
- Mulita, chama as tuas filhas, para cada uma dar uma gota de leite para o meu filho!…
- Senhora Virgem, - respondeu a mulita, - a minha ninhada é grande, porém nela as filhas são poucas…
E chamou suas poucas filhas, e cada uma deu uma gota de leite para acalmar a fome do Menino, que calou-se, farto.
Depois, cada mulitinha tomou seu rumo, no deserto; só ficou a mulita mãe, acompanhando.
Quando iam já muito longe, avistaram a escolta que vinha em perseguição; e à frente, ameaçador, o centurião!…
Então a Virgem, muito aflita, disse:
- Mulita, dá-me a tua força, para puxar o carro do meu filho!…
E a mulita puxou; mas era tão pouca a sua força que o carro quase nada adiantava.
Nossa Senhora, chorou, de medo, e tornou a dizer:
- Mulita, chama os teus filhos, para darem a sua força e correrem, puxando o carro do meu filho!…
- Senhora Virgem, a minha ninhada é grande, porém nela os filhos são poucos…
E chamou os seus poucos filhos, que começaram a correr, puxando o carrinho do Menino Jesus…
E a escolta, cada vez mais perto!…
Mas o carro, agora puxado pelos filhos da mulita ia sempre andando depressa.
Mas os cavalos são maiores que as mulitas e por isso vencem mais terreno… e já a escolta estava perto… perto…, quando levantou-se um medonho temporal de areia, que obrigou os soldados e o centurião a dispersarem-se, entre gritos de raiva…
Então, quando viram que o Menino Jesus estava salvo, cada mulitinha tomou seu rumo no deserto; só ficou a mulita mãe, acompanhando.
Então, Nossa Senhora tornou a dizer:
- Mulita, em memória das gotas de leite das tuas filhas, em memória da força dos teus filhos, deste dia em diante, de cada vez que deres ninhada, será sempre ou só de fêmeas ou só de machos!…
E a mulita respondeu:
- Pois assim seja a vossa vontade, Senhora Virgem! Porém eu peço que ordeneis que o mesmo seja para a minha boa comadre, a tatua…
- Pois será, também!
Então, a mulita tomou seu rumo, no deserto, e foi levar a nova à sua comadre tatua, que ficou muito contente."